quarta-feira

- Chegue aqui dentro!
- Eu?
- Sim, você.
- Mas... agora não dá... é que eu...
- AGORA!!!
(Rompe num choro convulsivo. Os outros dão-lhe pancadinhas nas costas, segredam-lhe)
- Não ouviu Paula?
- Mas...
- Entre e feche a porta.
(Lá veio, os lenços de papel num frangalho, a pintura num desatre, o rosto malhado de vermelho)
- Feche a porta.
- Mas, é mesmo preciso? Não me posso demorar...
- Você é surda? Feche a porta!
(Não há paciência...)
- Sente-se. E páre com o choro.
- Não consigo...
- O que você não consegue é parar, olhar-se, deixar de ter pena de si, fazer a sua vida e a dos outros num inferno. A minha, num inferno!
- A sua, Edna?
- Não sou eu que lhe pago o ordenado? Então tenho direito a que cumpra a sua parte do contrato! Eu dinheiro, você, trabalho! Entendeu?
- Estou com problemas... não é fácil...
- Ora! O seu problema está no meio das pernas!
- Como?
- Arranje quem lhe dê uma boa trancada e acaba-se-lhe as crises! Os chorinhos!
- Desculpe, mas eu não lhe admito...
- Quem não se admite é você Paula! Encare-se! Já passou, acabou. Ninguém morreu! Mas está a pôr o seu sustento em risco se permanecer nestas condições em que nada produz e ainda arrasta os outros para um deficiente desempenho. Assim, não dá!
- Está a dizer-me... que... eu não acredito!
- Pois é bem melhor para si que acredite! É a segunda vez que estamos as duas nesta situação. Já lhe chamei a atenção, você insistiu, enrolou-se com o Daniel e voltámos ao mesmo. Agora diga-me... Acha que eu posso aguentar? A empresa pode aguentar esta crise com produções miseráveis como a sua? Não acha que é injusto com os outros que dão tudo?
(O choro parou. Está feia. Caramba, como ficam feias as mulheres que se desfazem num choro por causa de um gajo...)
- E vá arranjar-se! Está num estado lastimável, despenteada, toda esborratada... não a quero ver assim. E agora saia. Feche a porta. E não se esqueça.
- Eu tento, juro que tento mas...
- Feche a porta quando saír.

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