sábado

Aos poucos os poucos amigos voltam à cena.
De facto, não serão tão amigos quanto o que se manifestavam ou eu mesma cheguei a pensar.
O meu internamento afastou-os, ou então a verdade afastou-os.
Não me esqueci, mas por enquanto tolero-os a chegarem aos bochechos à minha vida, a ligarem interessadissímos no meu estado de saúde, na minha vida, o que tenho feito.
De quando em vez divirto-me com o meu amigo gay, permito que ache que nada mudou, mesmo que durante meses tenha desaparecido completamente da minha casa, da minha existência. É ele que me põe a par das tendências da moda, dos últimos escandalos da Madona, das alcovitices do resto do grupo.
Volta. Para comer da minha comida e do meu génio, que ele admira.
Volta, para afogar as mágoas e iras sobre uma bichisse qualquer que lhe deu com os pés.
Volta, também, para me espicaçar quanto às noticias sobre o casamento e a viagem de lua-de-mel do outro.
Desta vez não lhe peço que não conte, estou realmente interessada em saber que tudo correu mal, que foi tudo um engano, que não se adaptou ao cabresto e fugiu. Mas não me conta nada disto, porque aquilo que eu quero mesmo que aconteça não aconteceu, tudo correu dentro de uma normalidade esperada.
Não digo nada. Decepciono-me. No meu intimo esperei por um final de uma longa metragem sobre o amor, em que o herói não ficando com o seu grande amor, escolhe o celibato puro e duro e nunca mais se consegue voltar a apaixonar.
Não digo nada, ouço-o e processo a informação, não me lembro dele, lembro-me do Magalhães, lembro-me que vai para dois dias que não o ouço, que ele não me telefona, que amanhã é dia do almoço em casa da minha Mãe e que tudo se torna mais leve quando ele me acompanha.
De repente aborrece-me a companhia do meu amigo, fico saturada da sua voz, dos seus guinchos, acho-o fraco por só assumir a sua homosexualidade entre paredes, as minhas, farto-me.
- Vai-te embora bicha!
- O quê?
- Sai! Rua!
- Edna!
- Fora! E não ponhas cá os pés tão cedo!
- Mas estamos a almoçar...
- Rua! Isto não é a Mitra! E fecha a porta quando saíres!
- Tu...Tu... Tu és tão superior... que ninguém te pega!

1 comentário:

SONY disse...

Às vezes nem tudo o que parece é. Os amigos, aqueles que o são mesmo, nunca se afastam, pelo contrário encostam-se mais ainda, cada vez mais. Os que se afastaram nunca o chegaram a ser.

Sony