domingo

Falemos de mim então.
De como sempre estes Domingos me consomem para além da paciência dos almocinhos na casa da Mãe, das conversas familiares, da curiosidade mórbida das vizinhas em querer saber se ainda sofro de males da cabeça, as perguntas sobre a identidade do Magalhães, as vãs esperanças da minha progenitora e a minha saturação quase nos limites quanto à vida em geral e no particular, a minha falta de vida.
Falemos de mim, pois: De como há dois meses que morro aos poucos,definho numa sorte lenta a normalidade para que corro todas as manhãs, trabalho todos os dias, regresso sem fome de nada e me deito já moribunda até ao enterro seguinte.
Eu não sou normal.
Não quero uma vida normal e estável, não quero segurança e uma velhice confortável.
Quero tudo agora, todos os riscos, todos os perigos, todas as mortes tentadas até me morrer de vez e não desejar mais nada da vida.
Abro o meu saco e vejo restos de mim, ainda assim agitados na mutilação infligida pela normalidade a que me obrigam ser. E agora? Agora procuro, remexo e não acho nada de mim.
Não gosto de mim como sou.
Quero-me de volta.
Toda, inteira. Mas sem o inferno do amor.

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